12 de abr. de 2020

A Última Páscoa de Codreanu (1938)

O Capitão no Funeral de Moța e Marin
Páscoa, 1938 - 24 de Abril - Prisão de Jilava

A umidade penetra nos meus ossos.

Respiro um ar de adega. Sinto o pulmão penetrado por agulhas, por balas.

Deito-me na cama de táboas. Doem-me os ossos. Fico cinco minutos de um lado, cinco minutos do outro.

Viro do lado esquerdo. Estou escutando o coração batendo. Ou pingam gotas de sangue dele?

Está escorrendo a vida do corpo cansado.

Oh, país! Como Você recompensa seus filhos!

Peguei no sono. Estou sonhando com Mamãe e Elvira Gârneatzá. Elvira me deu para beber uma caneca grande de água. Mamãe me disse: Estamos passando muito mal. Mudei para cá''. (estava numa aldeia das margens da cidade de Husi, do lado do Rio Prut).

Eu lhe falei: "'Vou até em cima da colina, com Nicoleta e Horodniceanu e quando voltar, vou deixar-te algum dinheiro e nao precisas te preocupar".

Tenho medo que algo passa lhe acontecer.

Ficou sozinha de novo. Um genro morto na Espanha, uma filha que ficou com duas crianças orfãs de pai. Eu na prisão. Outros quatro filhos, eles também presos ou prestes a serem presos. Atrás de um deles ficaram quatro filhos sem um pedaço de pão.

Meu pai saiu de casa para ir a Bucarest, para receber a pensão antes das festas de Páscoa e não voltou mais. Foi preso e levado para um lugar desconhecido.

Ninguém sabe o seu destino.

Em casa, para Páscoa, a mãe está nos esperando a todos, para passar as festas com ela. São tão poucas as alegrias de uma mãe velhinha; raramente e somente quando reúne seus filhos.

Nossa casa, para a Páscoa, está vazia. Ninguém dos esperados. Nenhuma alma ao lado da mãe. Os estranhos, todos a evitam e, por medo, não mais entram na casa dela.

Palpita um coração sozinho e está nos esperando a todos pelas prisões, correndo atrás de cada um pelas nossas celas para encontrar-nos. Para consolar-nos, para abraçar os nossos amargurados corpos.
Mas aonde, quando ninguem diz alguma coisa e não recebe qualquer noticia?

Oh, mãe, que choras sozinha pelos cantos da casa e que ninguem te ve, saibas que nós choramos por ti, neste dia de Páscoa, cada um em nossas celas.

Ontem, sábado, pedi que me mandassem um barbeiro para me fazer a barba; tinha crescido irregularmente numa semana, na face gelada. Veio o barbeiro da prisão, um pobre cigano condenado. Faz-me a barba e lavei o rosto pela primeira vez esta semana.

Espero a Ressurreição do Senhor.

Codreanu e Padre ortodoxo.
Vou pedir uma vela ao suboficial. Aqui não há onde comprar, mas talvez teria alguma a mais em sua casa.

Os dois oficiais, o tenente Mastacan e o tenente ... vieram tambem para fazer o seu serviço antes do toque de recolher. Especialmente porque na acomodação para onde fui trazido desde ontem não esta funcionando a lampada.

Que infelicidade! Está me passando pela mente que seria um mau sinal. Pela primeira vez na vida terei que passar a Ressurreição sem luz. No escuro. Sozinho.

Mas os oficiais e o suboficial ... Após varias tentativas acenderam a luz.

Trouxeram-me, também, uma pequena vela de cera, que me deram com especial boa vontade.

Eles, nos poucos minutos de visita regula mentar, duas ou três vezes por dia, não falam comigo.

Nem eles têm o que me dizer, nem eu lhes pergunto qualquer coisa. As suas unicas palavras são: "Precisa de alguma coisa?" as quais eu respondo sempre "Não".

Mas, sinto nos seus olhos que eles entendem toda minha tragédia espiritual. Dão-se conta da importância da minha culpa e da responsabilidade de dirigir um movimento de mais de milhão de almas, no qual está se jogando o destino de uma nação, assim como das dores que estão passando pelo meu coração, por aqueles da minha casa e por cada um das centenas e mesmo milhares de legionários, que neste momento estão aceitando os mesmos duros sofrimentos.

Compreendem, também, a situação humilhante em que fui jogado. Pois, a privação da liberdade é uma coisa e o que se passa comigo aqui, é humilhação, é degradação, até o maximo do ser humano.

O que não compreendem, talvez, são as maquinações e todos os planos diabólicos que estão sendo preparados para minha destruição e do meu Movimento.

Procura-se, a qualquer preço, alguma coisa, para se arrancar uma condenação grande. Ou a reabertura, de alguma forma do processo Duca, ou o meu envolvimento no processo Stelescu, ou a qualificação do Movimento, até agora, de anárquico e terrorista e a tentativa de uma condenação por este motivo. Uma condenação se obtém fácil por ordem.

No entanto, a opinião pública poderá julgar com a sua consciência, a nossa inocência.

E o nosso sacrifício se elevará até o Céu, e Deus, o supremo Juiz, nos escutará tambem a nós.

Estou com a alma carregada de injustiças.


Deitei de novo na cama de táboas. Estou esperando bater 11 horas da noite, quando o povo começa a partir para as igrejas. Estou me cobrindo com o sobretudo. Não posso me deitar de costas, porque me dói, mas não sei porque, não posso entender: a coluna ou os rins?

Pelas frestas entre as taboas, pela esteira e pelo cobertor, vem uma corrente de ar frio do chão cimentado, que passa também pela roupa e atinge as costas enfraquecidas.

Viro para o lado direito e puxo os joelhos até a boca. Doêm-me as cadeiras. Tenho a impressão que sou todo pus. Não posso ficar de um lado mais que cinco minutos. De outro lado dói do mesmo jeito.

Estou pensando na "filha da mamãe'' (Catalina). Como estará ela dormindo com os dedinhos na boca e sonhando com Papai Noel, que lhe traz brinquedos?

Nas festas de Natal dormiamos com ela na cama, De repente a escutei gritando no sono. Despertei-a: "que é que houve filhinha?". Papai Noel caiu de cima da casa com um saco de brinquedos''. Um anjo inocente que não sabe todas as nossas dores. Completará apenas 4 anos.

Corneliu Codreanu e sua filha. 

Seriam 11 horas. Levanto-me, me lavo, visto o sobretudo. Sento na beira da cama e olho o deserto ao meu redor.

Estou sozinho.

Estou me lembrando: festejei a Páscoa na prisão em mais outras duas ocasiões. Em 1925 em Focşani e em 1929 em Galata.

Nunca porém estive tão triste, sentindo tanta dor e cheio de tantos pensamentos.

Tomo o livro de preces e começo a ler. Rogo a Deus por todos. Pela minha esposa, com tantas dificuldades e cheia de dor, pela minha mãe, que outra vez deve ter recebido visita dos comissários de policia de Huşi e a tenham maltratado, procurando por meu pai, que deve estar em, quem sabe, que cela, nesta noite; pelos meus irmaos, também.

Ion Moța, Ion Codreanu e Corneliu Codreanu

Depois para os combatentes legionários, velhos e moços, estes heróis e mártires da fé legionária, levados de suas casas para quem sabe que prisões.

Quanta tristeza e quantas lágrimas não haveriam agora em centenas de familias romenas.

Rogo depois por todos os mortos. Avós e parentes, assim como amigos que em vida me amaram e me ajudaram.

Vejo todos, um a um. Eis o Senhor Hristache... e, por último, me aparece Ciumeti, com o grupo de legionários mártires caídos no seu tempo.

Na frente deles, grande, vejo sua figura como numa tela... velho, velho há meio milênio, com cabelos longos e com a coroa na cabeça, Estevão, Senhor da Moldávia.

Rogo por ele. Ele me ajudou em tantas e tantas lutas.

Eis o nosso General (Cantacuzene), o herói legendário com a sua série de mártires legionários, com aqueles caídos nas últimas lutas.

Ion Moța, braço direito de Codreanu
Ei-lo, ao lado do General, de camisa-verde e com cinturão, Marin, o herói dos campos espanhóis.
Moța, irmão querido Moța, parte-me o coração quando te vejo. Partimos nós dois juntos, eramos quase crianças, há 15 anos, para esta luta. Vejo-te ágil e temerário. Enfrentando as adversidades. Penetrando com teus olhos de aço o coração dos inimigos.

Vejo-te mais tarde, encoberto de dificuldades e pobreza, num País em que, mesmo para Ion Moța não se encontrava pão. Para conseguir este pobre pão, na Romênia, toda sua inteligência não era suficiente; era-lhe necessário também um coração de traidor.

Vejo-te trabalhando desesperadamente. Vejo-te obtendo sucessos brilhantes nos exames, na imprensa, nos tribunais, na cátedra.

Vejo-te arrastado para a prisão. Humilhado e cheio de amargura. Vejo teus ombros caídos e a alma enlutada de tantos ataques pérfidos. Vejo-te tremendo e chorando por mim.

Vejo-te partindo para a morte. Para dar a esta Estirpe a prova suprema. Para nos libertar, a nós, pela tua morte. Para abrir com teu peito esfacelado, com tuas pernas quebradas o caminho da vitória de uma geração.

E, olha agora para nós, querido Moța. Eu estou jogado como um cão aqui... em cima destas táboas. Sinto os ossos doloridos e meus joelhos tremem de frio.

Todos os nossos, toda a flor desta Romênia, esta caída, deitada em, quem sabe, que prisões.

Senhor, rogo-te nesta noite da Ressurreição, recebe meu sacrificio.

Tome a minha vida. Pois a ti, oh, País! não te são necessárias nossas forças, tu queres nossa morte.

Teria passado da meia-noite. Talvez seja uma da madrugada.

Não escutei os sinos tocando a Ressureição.

Acendo a vela e digo: "Cristo Ressuscitou!!"

O povo, nas aldeias e nas cidades, volta para casa com as velas acesas. Todos os nossos, as nossas famílias , choram esta noite.

Abri uma lata de sardinhas e comi uma delas. Desde 2a. feira à noite não comi mais.

Bebi meia caneca d'água.

Encolhido em cima da esteira, peguei no sono...

CODREANU, Corneliu Zelea. Anotações da Prisão de Jilava. Sociedade Editora Dácia, 1988.

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