28 de mar. de 2020

O Encontro de José Antonio e Mussolini (1933)


O homem é o sistema, e esta é uma das profundas verdades humanas que o fascismo fez voltar a ser valorizada. Todo o século XIX foi gasto tentando idealizar-se máquinas de bom governo. Tanto vale propor-se a encontrar a máquina de pensar ou de amar. Nenhuma coisa autêntica, eterna e difícil como é o governar, pôde realizar a máquina; sempre teve que recorrer à última hora àquele que, desde a origem do mundo, é o único aparato capaz de dirigir aos homens: o homem. Isto é, o chefe. O herói.

Os inimigos do fascismo interpretam esta verdade pelo inverso e fazem dela um argumento de ataque. "Sim – reconhecem – a Itália ganhou com o fascismo; porém, e quando morrer Mussolini"? Creem dar com isto um golpe decisivo ao sistema, como se houvesse sistema algum que se garantisse pela eternidade. E, sem embargo, é mais provável que, quando Mussolini morrer, sobrevenha para a Itália um momento de inquietação; porém um momento só; o sistema produzirá – com um parto mais ou menos laborioso – outro chefe. E este chefe voltará a encarnar o sistema por muitos anos. Mas ele – Duce, condutor – seguirá a fé de seu povo na comunicação de homem para homem, nessa forma de comunicação elemental, humana e eterna que deixou seu rastro por todos os caminhos da História.

Estive junto a Mussolini, numa tarde de outubro de 1933, no Palazzo Venezia, em Roma. Aquela entrevista me fez entrever melhor o fascismo italiano que a leitura de muitos livros.

Eram seis e meia da tarde. Não havia no Palazzo Venezia o menor assomo de agitação. À porta, dois milicianos e um porteiro pacífico. Dizem que penetrar no Palácio onde trabalha Mussolini é mais fácil que ter acesso a qualquer Governo Civil. Apenas indiquei ao porteiro aonde me dirigia, e me fez chegar – por largas escadas silenciosas – à antessala de Mussolini. Três ou quatro minutos depois se abriu a porta. Mussolini trabalha em um salão imenso, de mármore, sem móveis. Além, distante, em uma quina, no outro extremo da porta de entrada, estava atrás de sua mesa de trabalho. Se lhe via de longe, só, na imensidade do salão. Com a saudação romana e um sorriso aberto convidou que me aproximasse. Avancei não sei quão rápido. E, sentados os dois, o Duce começou seu colóquio comigo.


A mesa de trabalho do Duce italiano.

Eu o havia visto numa audiência rituária, anos antes, quando fui recebido com vários alunos da Universidade de Madri. Como todos os habitantes do mundo, o conhecia pelos retratos: quase sempre em atitude militar, de braço erguido. Porém o Duce do Palazzo Venezia era outro, distinto: de cabelo grisalho; com um ar sutil de cansaço; com certo pulcro descuido em sua roupa civil. Não era o chefe das arengas, senão o da maravilhosa serenidade. Falava lentamente, articulando todas as sílabas. Teve que dar uma ordem por telefone, e a deu no tom mais tranquilo, sem pôr na voz o menor assomo autoritário. Às vezes, quando alguma de minhas palavras lhe surpreendia, deitava a cabeça para trás, abria os olhos desmesuradamente e, por um instante, mostrava, rodeadas de branco, suas pupilas escuras. Outras vezes sorria com calma. Era notável sua atitude para escutar.

Falamos por cerca de meia hora. Logo me acompanhou até a porta através do imenso salão. Não é de grande estatura; já não tem, se alguma vez a teve, a postura erguida de um chefe de milícias; antes, suas costas já começam a curvar-se ligeiramente. Ao chegarmos os dois à porta, me disse com uma calma paternal, sem sombra de ênfase:

– Lhe desejo o melhor de tudo, para você e para Espanha.

Logo voltou para sua mesa, devagar, a retomar a tarefa em silêncio. Eram sete da tarde. Roma, acabadas as fainas do dia, se derramava pelas ruas sob a tíbia noite. O Corso era todo movimento e conversas, como a rua Alcalá nestas horas. A gente entrava nos cafés e nos cinemas. Dizem que somente o Duce permanece, laborioso, junto a sua lamparina, no rincão de uma imensa sala vazia, velando pelo seu povo, pela Itália, à que escutava palpitar dali como a uma filha pequena.

Que aparato de governo, que sistemas de pesos e medidas, conselhos e assembleias, pode substituir esta imagem do Herói feito Pai, que vigia junto a uma luzinha perene o afã e o descanso de seu povo?

PRIMO DE RIVERA, José Antonio. Obras Completas. Publicaciones Españolas, 1950.